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quinta-feira, 15 de outubro de 2015

CRÔNICA: AQUELES DONOS DO SERTÃO

Rangel Alves da Costa*


Não faz muito tempo que duas irmãs da família Marinho (as herdeiras Adélia Ferreira Marinho e Luzia Ferreira Marinho), da região de Canindé do São Francisco, estavam judicialmente reivindicando a posse de grande parte das terras dos municípios de Poço Redondo e Canindé. Segundo elas, aquelas terras foram deixadas como herança por seu pai, Amâncio Ferreira da Silva, que as adquiriu de Francisco Correia de Brito em 1947. A área individualizada adquirida ao Sinhô Correia fazia parte do Morgado de Porto da Folha e consistia em nada menos que cento e noventa e três mil e quinhentos hectares. Quase um sertão inteiro!
Tanta terra sertaneja de um dono só e num sertão que por muito tempo não teve dono. Não no sentido de direito sobre a terra, eis que os senhores da colônia já estavam definidos nas capitanias concedidas, mas no sentido de presença que caracterizasse a posse. E dentre os motivos de o sertão ficar por longo tempo inabitado e inexplorado estavam precisamente a localização, as dificuldades de acesso e o desinteresse do donatário em arriscar empreitada muito além das áreas litorâneas. Então, a imensidão de terras restou à espera de ser desbravada e povoada.
Por direito concedido, o dono de tudo era Francisco Pereira Coutinho. Com efeito, toda a faixa de terra englobando o sertão sergipano fazia parte da Capitania da Baía de Todos os Santos, cujo donatário era o referido fidalgo português, e depois passou, por subordinação, à Capitania de Sergipe del-Rei, cujo mandatário era Cristovão de Barros. Era, pois, um sertão com dono no papel, mas não que fizesse da propriedade ou domínio qualquer utilidade prática. Quer dizer, era um sertão com proprietário, mas sem ninguém que exercesse qualquer tipo de posse.
Como decorrência, durante muito tempo as terras sertanejas ficaram entregues aos caprichos da hostil natureza, às próprias forças do tempo. Diante da inação do donatário, não houve outra saída à coroa portuguesa senão dividir as terras sergipanas inexploradas em sesmarias. A partir destas, as terras incultas ou abandonadas eram loteadas e entregues a pessoas interessadas na sua exploração. Foi assim que aquela extensão do sertão Sergipano do São Francisco, a partir da Serra da Tabanga e numa extensão de dez léguas, passou ao domínio de Tomé da Rocha Malheiros, no início do século XVII.
O florescimento da sesmaria outorgada impulsionou o povoamento do sertão, principalmente a partir da Boca da Mata, atual Nossa Senhora da Glória. E mais adentro, onde a aridez se misturava ainda mais à vegetação catingueira e cactácea, o surgimento do Morgado de Porto da Folha, a partir de 1807. Com uma área ainda maior do que aquela de Rocha Malheiros, Antônio Gomes Ferrão de Castelo Branco registrou na Câmara de Propriá o seu domínio sobre uma área de trinta léguas de extensão.
Há, contudo, divergências históricas acerca de ter sido o fidalgo português Ferrão de Castelo Branco, o verdadeiro senhor daquelas terras sertanejas. Escritos dão conta que, à moda da usurpação de tantos outros nobres portugueses das terras e coisas brasileiras, este fidalgo bem poderia ter registrado um domínio que já pertencia a outras famílias. Mesmo com a existência do morgado, a verdade é que as terras de regiões mais distantes do sertão, como Poço Redondo e Canindé, eram tidas como de eréu, ou seja, terras sem dono e cuja posse e domínio coube aos poderosos e coronéis de então.
Também verdade que os primeiros colonizadores da região sertaneja se valeram dos latifúndios para sua empreitada. Ter muita terra significava poder, riqueza, reconhecimento político. Gerônimo da Costa Taborda, por exemplo, se tornou senhor da Ilha do Ouro, em Porto da Folha, e neste Tomás Bermudes como senhor do Curral do Buraco. O Coronel Luís Tavares, também conhecido como Lulu Tavares, estendeu seus domínios à região de Poço Redondo e Canindé, enquanto o Coronel Francisco Cardoso de Britto Chaves, ou simplesmente Coronel Chico Porfírio, foi praticamente o dono de todo o Canindé. Há também um testamento de Francisco Alves Feitosa constando ser o mesmo dono de três léguas de cumprimento e uma de largura em Poço Redondo. Mais de vinte quilômetros de terras!
Há de se considerar, contudo, que os títulos de tais terras eram quase sempre precários. Os antigos donos se arvoraram do domínio muito mais por poder e influência política do que mesmo por direito. Tanto foi assim que depois de muito tempo ainda restava uma vastidão de terras sem dono de canto a outro de Poço Redondo. Foram tais terras, oriundas dos eréus, que formaram os grandes latifúndios. O tamanho de cada propriedade era tal que o seu suposto dono apenas conhecia os limites, mas não a dimensão em si. Dizia apenas que sua terra ia da beira do rio até divisar com tal região.
Foram os tempos dos grandes latifúndios, das imensidões de terras improdutivas ou grandes demais para a exploração. A Barra da Onça, de Toinho Leite, foi um exemplo típico de tal situação. Mas outros senhores de renome, tais como os irmãos João Maria de Carvalho e Piduca Alexandre, Antônio Caixeiro, Major Cesário Dória e mais recentemente Hercílio Britto, filho de Chico Porfírio, e sua famosa Fazenda Cuiabá. Estes eram os donos daquele sertão sergipano de antigamente.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

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Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém...
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