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domingo, 4 de maio de 2014

CRÔNICA: CHUVISCOS, CHUVAS E CHUVARADAS - Rangel Alves da Costa*


Rangel Alves da Costa*


O clima ainda continua quente, mas não com aquele calor insuportável de uns quinze dias atrás. O templo nublado, o ar em maior e constante movimento, bem como as nuvens que se derramam de vez em quando, tudo isso faz com que a temperatura deixe de ser tão torturante. Mas haveria de ser assim, eis que as invernadas já se anunciam como salvação.
E salvação não apenas para o homem do campo, para o sertanejo nas distâncias matutas, mas para todo aquele que espera melhoria no preço dos alimentos, ter garantido o milho no São João, ter uma mesa mais farta e com alimento fresco saído da terra. E somente as chuvas para que o homem se anime para o preparo do solo, o plantio e a colheita.
Por isso mesmo que chega como prenúncios bons essa mistura no derramamento das nuvens. Mistura porque ainda não chegaram as trovoadas nem as chuvas mais fortes e constantes, mas apenas uma mescla de molhação, que vai desde o chuvisco à chuvarada. Eis que o tempo nublado ora traz apenas uma chuvinha miúda, ora uma chuva mais espessa e também a chuvarada mais potente e com ventania.
Os dois últimos dias estiveram neste misto climatológico. As chuvaradas começam a cair na noite, avançando na madrugada, para depois se transformar apenas em chuvas inconstantes. De repente e o tempo fecha para que as nuvens despejem as suas águas. Mas tudo muito rápido, passageiro, diferente do que geralmente ocorre na madrugada, com chuva forte de causar transtornos e alagamentos.


Nas chuvaradas assim, de barulhar nos telhados e descer sobre as ruas um véu contínuo de pingos grossos que depois escorrem pelas vias e inundam canteiros, muitos aproveitam para dormir melhor. Primeiro ouvem a canção da chuva caindo e em seguida dançam a valsa das saudades e dos sonhos incertos. Mas outros preferem ficar observando o cair das águas para viver as nostalgias da noite e reabrir os livros velhos das recordações.
Já os chuviscos tomam conta de parte da manhã e da tarde. Quase não encharcam ninguém, não formam poças nem impedem que as pessoas saiam de suas casas, mas também não garantem que cabelos não sejam desarrumados e elegâncias desfeitas, vez que todos parecem sempre iguais andando apressadamente, cabisbaixas ou portando guarda-chuvas. E as ruas são tomadas de pessoas assim, numa correria danada para fugir dos chuviscos.
Verdade é que enquanto uns louvam a Deus pelas bençãos das chuvas, outros se dizem chateados com a molhação. Muitos preferem caminhar molhados de suor a sentir pelo corpo os pingos leves que caem. É uma questão de não querer aceitar as necessárias transformações. Ademais, se as chuvas nada significam para muitos que moram nas cidades grandes e têm o asfalto por chão, diferente ocorre com os viventes dos sertões e das brenhas esturricadas.
Se para o homem urbano as chuvas podem trazem transtornos, resfriados e outras doenças, além de impedir tantas práticas no conforto de seu dia a dia, para o homem do campo tais concepções possuem norteamentos muito diferentes. É no pingo d’água que mora sua esperança de sua sobrevivência, é na gota de chuva que está a possibilidade de um amanhã sem esmolas ou padecimentos, é na trovoada que vem toda sua seiva de vida.
No sertão de onde vim, basta que as nuvens escurecidas se aproximem e os olhares já fazem a festa da esperança, os olhos marejam quando caem os primeiros pingos e tudo fica perfumado pelo cheiro que vai subindo da terra com a molhação. Coisa linda de se ver é o sorriso sertanejo em momentos assim, onde goteira se torna motivo de alegria e as correntezas vão levando os acúmulos de sofrimentos por causa das estiagens.
Mas mesmo a insensibilidade tão própria da cidade grande não ofusca o encantamento trazido pelas águas da estação. Seja através dos chuviscos, chuvas ou chuvaradas, há um tempo que se renova, se banha e se inunda para dias melhores. Igualmente ao ser humano que toma banho para se limpar e se sentir mais refrescado, o tempo também sente a necessidade dessa renovação. Por isso esses pingos que ouço lá fora e me fortificam por dentro.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém...
Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim...
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